Sunday, January 29, 2006

Sarau Ciclo das Chamas









Sarau Ciclo das Chamas

A Academia Itaperunense de Letras se fez representar na Casa das Rosas- Espaço Haroldo de Campos de Poesia, local preservado pelo patrimônio histórico da cidade de São Paulo, por ocasião do Sarau em homenagem ao poeta, jornalista e professor emérito da UNESP Antônio Lázaro de Almeida Prado através da professora e poeta Luciana Pessanha Pires, membro desta Arcádia, no dia 21 de janeiro, às 18h.
O evento, presidido por Fernanda Maria Bueno de Almeida Prado, psicanalista, filha e agente literária do poeta, contou com apoio da diretoria deste Centro Cultural, nas pessoas de Donny Correa, poeta e coordenador, e de Frederico Barbosa, poeta, escritor e diretor.
Frederico fez a abertura homenageando merecidamente a organizadora do sarau.
Fernanda reuniu intelectuais de várias partes do Brasil, dentre eles, poetas, escritores, professores e Doutores, como o professor Dr. Álvaro Lorencini, Maria Antonia Soares, poeta de Presidente Venceslau, empresária e professora de Literatura, Nilton Alves, poeta, professor, arquiteto do RJ, Anna D' Castro, poeta e atriz portuguesa, Ivy menon, poeta e jornalista de Maringá, Paraná, Marcelo Tápia, poeta, tradutor e editor, de São Paulo, Ozias Stafuzza, poeta, psicólogo, músico, de São Paulo, Guca Domenico, poeta, escritor e músico fundador do grupo Língua de Trapo, de São Paulo, Pedro Paulo Trindade, advogado e incentivador das Artes, Elza Calisto, psicóloga e psicanalista de São Paulo e Neusa Zanirato de São Paulo.
Esta foi uma noite de encantamento, com direito à presença da musa do poeta, Themis Bueno de Almeida Prado.
No primeiro instante, houve declamações dos poemas do livro Ciclo das chamas e outros poemas - Ateliê Cultural, de Antonio Lázaro de Almeida Prado, a seguir, momento musical, finalizando com poemas dos poetas convidados.

(São Paulo- 21/01/06- Sarau Ciclo das Chamas)

Prontos para a vida





Já disse alguém que o cotidiano pode ser redescoberto a partir de novos olhares. A vida guarda emoções e sentimentos que merecem ser desvendados. Perguntas, e descobertas, sonhos, fantasias, amor... Nossa vida é cheia de histórias. páginas alegres, tristes. Caminhos trilhados e imaginados.
Amar é uma forma de caminhar pela vida, de entusiasmar-se, de colocar brilho nos olhos. Quando amamos somos mais generosos, mais flexíveis. Nossa história fica mais bonita.
Há quem faça do amor uma história desprezível. nem todos merecem o amor. Dizem amar com gestos loucos. Mas o amor que torna a nossa vida melhor não é assim, tem flores, gentilezas, palavras suaves, tem doçura, tem respeito, tem entrega.
A presença da pessoa amada transmite uma sensação interior, de serenidade.
O amor é uma emoção apaziguante. Quando amamos, ficamos receptivos, equilibrados. prontos para a vida. Somos instigados à abertura, à sinceridade, ao diálogo.
(Crônica publicada no Jornal Tribuna do Noroeste- Itaperuna- RJ)

Habite-se





Intermináveis crises existenciais nascem do questionamento sobre a finalidade da vida humana. Quem não quer saber a que veio?Em Cajuína, Caetano Veloso pergunta “Existir, a que se destina?”. Procuramos o sentido das coisas. Para Fernando Pessoa “o único sentido oculto das coisas é elas não terem sentido oculto nenhum. As coisas são realmente o que parecem ser e não haja nada que compreender.Drummond, num café, diante da morte e do tédio lamentou ser a vida uma agitação feroz e sem finalidade; uma traição.Será que Vicente de Carvalho acertou ao dizer que “a vida não é mais que uma esperança malograda”? Em Amor de perdição, de Castelo Branco, Tereza de Albuquerque pergunta a Simão Botelho “Poderias tu com a desesperança e com a vida?”. Será que a vida é apenas um lamento do que deixou de ser?Um trecho do Romance Werther, de Goethe em que o personagem central se corresponde com um amigo registra as seguintes palavras:“ A vida humana não passa de um sonho. Quando vejo os estreitos limites onde se aham encerradas as faculdades ativas e investigadoras do homem, e como todo o nosso labor visa apenas a satisfazer nossas necessidades, as quais não têm outro objetivo senão prolongar nossa existência ... tudo isso me faz emudecer”Clarice Lispector, ao dizer que “se a pessoa na estiver comprometida com a esperança, vive o demoníaco”, não têm razão? Vinícius de Moraes diz que a vida é para viver, a vida é para levar.Talvez o nosso desejo latente seja viver, não apenas existir. E viver agregando significado à vida, porque vida há.A despeito de tantas constatações existenciais, viver é apesar. Contingências, pedras no caminho, são constantes. Por isso é preciso resiliência, ser textura fiável, flexível, resistente aos embates; enxergar com os olhos livres; inventar o novo.

O coração como ata romana





No princípio era o verbo... e os gestos que marcavam as manifestações de vontade, os atos públicos eram praticados nas portas da cidade e no paço municipal onde se encontravam a administração e a Justiça. Nesse tempo, as expressões de vontade eram marcadas por rituais, compostos por palavras, gestos e expressões.
A imagem da Ata Romana do tempo da Roma Antiga nos convida a trazer à tona nossa ata particular no centro das intenções: a praça.
Paço, pátio, praça... nesse local de encontro deixaremos fluir toda necessidade de integração que há em nós. Segundo o verbo latino Patēo, os atos de expor, abrir e descobrir-se se fazem presentes nesse espaço.
Na praça há uma postura ativa perante o mundo. O indivíduo se faz ser visto e adquire uma razão de ser. Ali, com o coração descoberto, desnudo, relacionando-se diretamente com a abóbada celeste e, conseqüentemente, com todas as manifestações climáticas, exposto, acessível, suscetível, o homem pode permitir-se. Permita-se. Traga seu coração para praça e faça dele uma Ata Romana.

Saturday, January 07, 2006

De amor e desamor














Augusto dos Anjos, no poema Contrastes, disse:

A antítese do novo e do obsoleto,
O Amor e a Paz, o ódio e a Carnificina,
O que o homem ama e o que o homem abomina,
Tudo convém para o homem ser completo!


Vivemos titubeando entre amar e desamar. Já disse Drummond:
“De acrílico, de fórmica, de isopor, meticulosamente combinados, fiz meu segundo coração, para enfrentar situações a que o primeiro, o de nascença, não teria condições de resistir. Tornei-me assim, homem de dois corações.Fiz meu coração sem ninguém saber, e à noite em perfeita lucidez... instalei lá dentro esse coração especial, regulado para não sofrer. Ao mesmo tempo, desliguei o outro... possuo extrema habilidade manual, aguçada à noite.”(Coração segundo, de Carlos Drummond de Andrade)
O poeta sabia sobre nossa inclinação para amar desamar, amar:
Amar

Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar? sempre, e até de olhos vidrados, amar? Que pode, pergunto, o ser amoroso, sozinho, em rotação universal, senão rodar também, e amar? amar o que o mar traz à praia, o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha, é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia? Amar solenemente as palmas do deserto, o que é entrega ou adoração expectante, e amar o inóspito, o cru, um vaso sem flor, um chão de ferro, e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina. Este o nosso destino: amor sem conta, distribuido pelas coisas pérfidas ou nulas, doação ilimitada a uma completa ingratidão, e na concha vazia do amor a procura medrosa, paciente, de mais e mais amor. Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.
Sobre essa graduação de sentimentos Machado de Assis escreveu:
"Ora, é preciso dizer, para encaminhar o espírito do leitor nesta história, que dois anos antes do tempo em que começo, tinha eu tido uma fantasia amorosa. Fantasia amorosa digo eu e não minto. Não era amor; amor foi o que eu depois senti, verdadeiro, profundo, imortal.
Para mostrar a graduação dos meus sentimentos depois desse episódio,. e até para melhor demonstrar a tese que serve de titulo a estas páginas, devo transcrever para aqui dois manuscritos velhos. Cada um tem a sua data; o primeiro é uma lamentação, o segundo é uma resignação. Há um abismo entre ambos, como há um abismo entre aquele tempo e o tempo de hoje.
...
Donde estou vejo o mar; a noite é clara e deixa ver as ondas que se vão quebrar à areia da praia. Uma vez solto onde irás tu, meu pensamento? Nem praias, nem ondas, nem barreiras, nem nada; tudo vences, de tudo zombas, eis-te aí livre, a correr, mar em fora, em busca de uma lembrança perdida, de uma esperança desenganada. Lá chegas, lá entras, de lá voltas ermo, triste, mudo, como o túmulo do amor perdido e tão cruelmente desflorado!
Ânsia de amar, ânsia de ser feliz, que haverá no mundo que mais nos envelheça a alma e nos faça sentir as misérias da. vida? Nem é outra a miséria: esta, sim; este ermo e estas aspirações; esta solidão e estas saudades; esta tão própria sede de uma água que não há tirá-la de nenhuma Noreb, eis a miséria, eis a dor, eis a tristeza, eis o aniquilamento do espírito e do coração.
Que é o presente em tais casos? O vácuo e o nada; no passado o luzir leve e indistinto quase de uma curta ventura que passou; no futuro a estrela da esperança cintilante e viva, como uma lâmpada eterna. Donde estamos, um ansiar sem tréguas, uns íntimos impulsos a ir buscar a felicidade remota e esquiva. Do passado ao futuro, do futuro ao passado, como este mar que invade estas praias agora, e amanhã irá beijar as areias opostas, tal é a vacilação do espírito, tal é a vida ilusória do meu coração.
...
Que me direis vós, meus livros? Queixas e consolações. Dais-me escrito o que eu tenho a falar no interior. Queixas de um sentir sem eco, consolações de uma esperança sem desfecho. Que havíeis de dizer mais? Nada é novo; o que é, já foi e há de vir a ser. Destas dores sentir-se-ão sempre e não deixarão de sentir-se. Círculo vicioso, problema sem solução!
Lembrei o Eclesiastes. Que me dirá esse tesouro de sabedoria?
- "Todas as coisas têm seu tempo, e todas elas passam debaixo do céu segundo o termo que a cada uma foi prescrito.
Há tempo de nascer e de morrer.
Há tempo de plantar e tempo de colher.
Há tempo de enfermar e tempo de sarar.
Há tempo de chorar e tempo de rir.
Há tempo de destruir e tempo de edificar.
Há tempo de afligir e tempo de se alegrar.
Há tempo de espalhar pedras e tempo de as ajuntar.
Há tempo de guerra e tempo de paz."
Assim fala o Eclesiastes. A cada coisa um tempo: eis tudo. qual será o tempo desta coisa? Qual será o tempo daquela? Tal é a dúvida, tal é a incerteza.
Destruo agora; quando edificarei? Aflijo-me; quando me hei de alegrar? Semeio; quando hei de colher? Virá o tempo para isso... Quando? Não sei! A certeza é uma: a certeza do presente; a da destruição, a da aflição, a da plantação. O resto - mistério e abismo. "



Assim são os avanços e recuos dos nossos sentimentos. Amamos com a intensidade permitida pelo instante. Desamamos porque tomamos novos caminhos e aquele amor não consegue nos acompanhar. Sofremos transformações. E o amor não é afeito às mudanças.