Thursday, May 28, 2009

Fragmentos das entrevistas publicadas na Comunidade 'Discutindo Literatura', no Orkut.

Há quatro anos criei a comunidade “Discutindo Literatura” no Orkut como proposta de incentivo à escrita significativa para uma turma de Ensino Médio. A recepção foi muito boa. Vislumbrei, no mar de frivolidades de muitas comunidades orkutianas, um sinalizador de que esse ambiente midiático poderia ser uma ferramenta preciosa para a tematização de questões, a formulação do debate, a circulação do conhecimento, a dinamização da cultura.
Iniciamos uma série de entrevistas com intelectuais, professores universitários, poetas e escritores, jornalistas, etc.

Trechos das entrevistas
Poesia
Antônio Lázaro de Almeida Prado - Doutor em Literatura pela Universidade de São Paulo, com a tese O Acordo Impossível, ensaio sobre a forma interna e sobre a forma externa na obra de Cesare Pavese. É jornalista atuante, tradutor, ensaísta e poeta com larga e altamente qualificada produção intelectual. Recentemente publicou o excelente Ciclo das Chamas, reunindo parte de sua vasta produção poética.

Penso que a melhor visão sobre o fazer poético foi definido por Giam Battista Vico. Segundo ele todas as crianças, vale dizer, todos os seres têm naturalmente vocação poética. A isso acrescento que de todas as artes a mais fundamentalmente humana é a arte da palavra, que requer, para fazê-la ou recebê-la, o exercício empenhado das melhores virtualidades humanas. Com isso, a poesia participa e requer inspiração, construção: aquela e esta imprescindíveis. Não há poesia que se faça pelo facilitário e é ela sempre fruto de um lúcido ajuste de emoções e palavras.
A leitura e as novas tecnologias
Hélio Consolaro (1948) é professor e jornalista, presidente da Academia Araçatubense de Letras, cronista diário da Folha da Região, Araçatuba-SP Publicou em 1997 seu primeiro livro Cobras & Lagartos, de crônicas. Em 2000, Urubu Branco (poemas), Em 2002 Filósofo de Semáforo (crônicas) Em 2004, Cerveja e uma Porção de Bobagem (crônicas burlescas). Coordenador do site Por Trás das Letras.
Apenas uma sociedade de analfabetos endeusa o livro. Apenas quem não sabe operar um computador, endeusa-o.O livro não é bom por si. A sabedoria não vem apenas pelos livros, ela está na tradição da vida, como disse Paulo Freire: antes de ler o livro, precisa-se aprender a ler o mundo.O iluminismo endeusava o livro, e temos resquício dele em nossa sociedade atual. Apenas servindo como exemplo, sem entrar em preferências políticas, é só ver a campanha negativa que o presidente Lula é objeto, porque não tem diploma universitário. Isso é herança iluminista. O livro poderá desaparecer, mas a leitura nunca. Irá mudar apenas o portador.
Se não houvesse a leitura, nunca teríamos chegado ao estágio atual (bem ou mal, está aí). A leitura foi essencial para chegar à tecnologia. Quando digo que o livro pode desaparecer, não o estou desprezando, apenas constatando. Embora seja considerado caro, o livro é uma mídia barata, versátil, mas no futuro pode ser sustituído por livros eletrônicos. Em vez de um volume, compraremos um cartão magnético com muitos volumes. E podemos pôr tais cartões em computadores de mão e ir lendo as histórias, os poemas, as teorias num ônibus, no metrô, no banheiro.Escola e governos não são, sozinhos, os responsáveis pela aquisição do hábito de leitura de nossoas crianças e jovens. A sociedade é a principal responsável, porque pai e mãe que não lêem dificilmente terão filhos leitores. Cadê as bibliotecas de nossos sindicatos de trabalhadores, de nossas empresas, de nossas igrejas, dos centros comunitários dos bairros? Também, apenas disponibilizar o livro não basta. A pessoa só vai valorizá-lo quando encontrar uma resposta para a sua vida na leitura. A proposta de pôr um livro na cesta básica que é distribuída mensalmente pelas empresas a cada trabalhador não basta. Outro aspecto importante é o ócio. Estamos trabalhando demais, e o pequeno tempo de ócio queremos passar com nossa família, tomar uma cerveja, ver um filme leve que nos faça rir, ficar num bate-papo na internet. Gastamo-lo com outras mídias.O processo de alfabetização de nossas crianças é o principal culpado de as pessoas não lerem. As pessoas ao ler um livro ou um texto pronuncia cada palavra, cada sílaba mentalmente, não aprenderam a fazer uma leitura gráfica do texto. Isso torna a leitura uma atividade cansativa. Em vez de demorarem três ou quatro horas para lever um livro, gastam semanas.
Sobre os livros caros no Brasil
Jiro Takahashi é de Duartina, uma pequena cidade do interior de São Paulo, é professor de Literatura e disciplinas correlatas, como Leitura e Produção de Textos, Estilística no Centro Universitário Ibero-Americano, no curso de Letras. É também tradutor e interprete desde 1979, com algumas interrupções por conta do trabalho editorial no Rio de Janeiro e em Londres. Estudou Direito e Letras, foi o primeiro editor da Editora Ática e atuou como gerente editorial da Ediouro, com passagens pelas editoras Abril, Nova Fronteira, Estação Liberdade e Editora do Brasil.
Tentando ser breve porque há questões técnicas que entram na discussão do preço do livro (mas fugindo delas aqui), há dois pontos que gostaria de ressaltar:1. O livro aqui é caro porque em geral não atinge o padrão de economia de escala. Tiragens normais de 2.000 exemplares não são industriais se compararmos com outros produtos de consumo. Além das tiragens baixas, o tempo para se esgotar, o território imenso do país, o risco do "encalhe" são outros fatores que os empresários da área consideram. Naturalmente, se as tiragens médias fossem muito maiores, os preços poderiam cair. (Digo, poderiam, porque há casos de altas tiragens em que os preços poderiam cair e não caem).2. Se considerarmos tudo isso, até que o livro não é tão caro considerando os preços praticados no Exterior. Com a globalização, houve um certo nivelamento dos padrões praticados nos valores. Um livro que custe 40 reais no Brasil corresponde a mais ou menos 18 ou 19 dólares. Acredito que nenhum americano ache isso um absurdo, principalmente se souber da tiragem. A questão é que 40 reais é mais do que 10% do salário mínimo. Então, além do livro caro, há um fato mais relevante, que é o brasileiro ganhar pouco. Com a globalização, muitos bens de consumo estão com preços quase equiparados no mundo, mas os salários do trabalhador médio são muito baixos por aqui. E isso dá uma sensação de o livro ser mais caro ainda. Mal comparando o frio parece mais intenso se você não está agasalhado.Sobre o formato dos livros da Martin Claret, acredito que isso não afeta a qualidade dos textos. Esta pode ser afetada por um trabalho editorial, mas não pelo formato em si. Acredito que as ações dessa editora, da LPM, da Jorge Zahar Editores, são louváveis a meu ver. No mínimo, são alternativas e tentativas de se buscar novas possibilidades, novos canais. Mais ou menos isso.
O maior repressor da venda de livros
Para mim o que inibe a venda de livros é sempre um conjunto de fatores, dificilmente um só. Mas isso lembra resposta na linha econômica ou sociológica. Para responder bem pessoalmente, o que contaria mais para mim seria o que disse antes, isto é, o papel, o lugar que o livro ocupa na escala das prioridades de cada um. Uma pessoa que deseja muito um cinto especial que viu numa vitrine é capaz de fazer de tudo para ter esse cinto, mesmo que relativamente ele custe caro. E não ficará reclamando do alto custo dos cintos no país. Aliás, às vezes, poderá falar com orgulho desse alto preço pago. O mercado do cinema nas capitais e de videolocadoras é enorme no país, impressiona os produtores americanos, que fazem questão de lançar imediatamente seus filmes no Brasil. Poucos estão satisfeitos com o preço dos bilhetes de cinema, mas a afluência é muito grande. No caso do livro, ele é muito vinculado a uma obrigação escolar, religiosa, moral, civilizatória (é claro que não ignoro esses usos). Por isso, quando o livro é muito atrelado à vida escolar para um jovem, tão logo deixe a escola o livro também deixa a vida do jovem. Infelizmente o prazer que o livro proporciona não é tão fácil de disseminar em alta escala e imediatamente por meio de mídia eletrônica, por exemplo.Mas acho que um leitor que goste muito do livro, pode até mesmo reclamar do preço, mas procurará adquirir mesmo que seja em sebos desde que ele queira muito.
GLOBALIZAÇÃO, NEOLIBERALISMO e PÓS-MODERNISMO

Everardo Paiva de Andrade, Doutorando em Educação pela UFF, Professor de História do Brasil e de Prática de Ensino da FAFIC, Presidente Emérito da Academia Itaperunense de Letras, poeta, autor dos livros de poemas: "Inventário de Tudo", Editora Cromos- Prêmio Nacional de Poesia Affonso Romano de Sant'Anna e "Sortilégio Antigo e Zen para a viagem", Editora FAFIC.
Não consigo não ter preconceitos e alguns poucos conceitos em relação ao termo e ao processo histórico concreto da globalização. Envolve significados e forças sociais que estão absolutamente fora de nosso controle, isto é, do controle do comum dos mortais: somos muito mais objetos do que sujeitos da globalização. Talvez a única coisa boa que consigo ver na globalização é que ela está exigindo de nós muita criatividade para encontrar e implementar estratégias sociais e culturais, portanto políticas, de resistência. Uma dessas estratégias consiste, precisamente, na ênfase em projetos que tenham forte caráter nacional e/ou local.Por outro lado, no meu modesto modo de ver, o conceito de globalização encontra-se profundamente articulado ao retorno de idéias liberais (note bem: em seu sentido histórico, não no sentido genérico de ausência de opressão), que a crítica especializada vem denominando de neoliberalismo. Então, ponhamos em contato três conceitos que são inseparáveis: GLOBALIZAÇÃO (no plano econômico), NEOLIBERALISMO (no político) e PÓS-MODERNISMO (na dimensão cultural). Os três, juntos, exprimem o estado atual do velho capitalismo...Nesse sentido, não posso, de jeito nenhum, concordar com a afirmação de que não possa haver liberdade, justiça e humanização fora da democracia liberal. Pelo contrário (e contra, radicalmente, tudo aquilo que a Revista Veja quer nos fazer acreditar), o novo liberalismo (articulado à globalização e ao pós-modernismo) é um instrumento que restringe a liberdade e a justiça, portanto de desumanização do próprio homem!
representa a face cultural (midiática, veloz, mistificadora) do voraz capitalismo contemporâneo, correspondente ao que representa a globalização, no plano econômico, e ao neoliberalismo, no plano político.

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