Friday, December 23, 2005

Entrevista feita por Irene Vieira- Entrevistado: Antônio Lázaro de Almeida Prado



1-Cite todas as suas obras, inclusive traduções
Sendo jornalista, desde 1944, e havendo colaborado em jornais de Piracicaba, São Paulo, Assis e de outros centros, o número de colaborações de caráter literário e de exercício da Crítica Literária é elevadíssimo e praticamente impossível de arrolar.
Pela Faculdade de Ciências e Letras do Campus de Assis publiquei os livros O Acordo Impossível (análise da obra de Cesare Pavese) e Itinerário Poético de Salvatore Quasímodo. Pela revista de Letras publiquei artigos e resenhas científicos. Publiquei ao ensejo do centenário da cidade de Assis: Assis/Passado/Presente e Futuro. E recentemente pela editora Ateliê, o livro de poesias Ciclo das Chamas e outros poemas. E, as seguintes traduções:Leon Poirier (Um Homem Chamado Francisco de Assis), de Gaëtan Picon ( O Escritor e sua Sombra), de Giambattista Vico (Ciência Nova), e de Giuseppe Ungaretti (Invenção da Poesia Moderna).
2-Fale sobre seu primeiro poema

Ainda na infância, alem de participar do Orfeão-Mirim Piracicabano, ( o que indica sensibilidade aos valores sonoros e rítmicos, escrevi poemas bastante singelos e compatíveis com a idade, em geral voltados para celebrações de afetos familiares. Isso ocorreu entre meus 8 e 9 anos. Desses poemas (curtos, como convinham para um pequeno caderno de notas) guardo muito escassa memória.
Voltei à poesia no meu estágio ginasial e já então percebi que a poesia podia traduzir tantos momentos alegres e eufóricos quanto a dor pela perda de um grande amigo, Thales Estanislau do Amaral (sobrinho de Tarsila Amaral).
E, então, ensaiei tanto o domínio de versos curtos, quanto o de idílios, sonetos, etc.

Cumpridos quatro anos (intermediários) de acentuada formação clássica(grego, latim, português, italiano, História) retomei os estudos no Instituto de Educação Sud Mennucci e nele freqüentei o Curso Clássico (Português, Francês, Inglês, Espanhol, Latim).
Fui lendo poemas de Manuel Bandeira que percebi possíveis as práticas do indevidamente chamado “verso livre”, ao lado de poemas de fundo clássico.
Então, ao cursar Letras Neolatinas na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, escrevi poemas em inglês(pouquíssimos), espanhol, francês e italiano, ao lado de poemas em português. Poemas que fui publicando em jornais de Piracicaba e São Paulo.
Dos primeiros poemas( de infância) busco recapturar os valores de comunicabilidade e combiná-los com a leitura e observ\ãncia das sugestões dos grandes poetas da Literatura Universal.
3-Momentos de rupturas, avanços na sua trajetória poética.
Como já fiz notar, os primeiros poetas, que me sensibilizaram, foram os que aprendi a admirar entre os gregos( os líricos, os épicos e os dramáticos), os latinos e os da tradições clássicos românicos e anglogermânicos.
Com o curso de Neolatinas passei a ler, intensamente, autores italianos, franceses, espanhóis, ingleses, brasileiros,portugueses, alemães,....
Assim, não houve propriamente rupturas, mas aberturas para a produção poética Universal.
Essa abertura ensinou-me que a poesia, tanto para recebê-la, quanto para produzi-la cobra e exige as melhores virtualidades humanas
.
4- Como foram seus encontros com escritores e quais suas afinidades com alguns.
Pela leitura, meu encontro com escritores iniciou-se muito cedo.
Das leituras infantis destaco as obras de Monteiro Lobato e de Thales Castanho de Andrade, que, mais tarde foi meu professor de História no Ginásio. Dos 13 aos 17 anos li autores gregos, latinos e italianos, mais Vieira, Bernardes, Camilo, Rui Barbosa, e através de uma Antologia de Estevão Cruz, tomei contacto com os grandes poetas brasileiros, inclusive os Modernistas.
Quanto a contacto pessoal, desde 1944 participei de Congresso de Escritores e conheci muitos autores brasileiros. Na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP pude conviver com autores internacionais, o que se deu também no Campus de Assis da UNESP, em encontros de Crítica e de História Literária, em Cursos Pós-Graduatórios, que ministrei.
Dentre os poetas que admiro Gonçalves Dias, os Árcades mineiros, Cruz e Souza, Manuel Bandeira, Mario de Andrade, Osvald de Andrade, Drummond, João Cabral de Melo Neto, e, particularmente, Murilo Mendes, Adélia Prado, Jorge de Lima, Dora Ferreira da Silva.
Claro está que tenho muito apreço pelas várias correntes de Vanguarda posteriores a 1922.5 - 5-O Sr.lê em várias línguas. Cite autores estrangeiros indispensáveis a um jovem poeta.
Para um jovem poeta ( no caso, brasileiro) a leitura de Drummond, Bandeira, João Cabral, Jorge de Lima, Murilo Mendes, Cecília Meireles, os das gerações posteriores a 1945...
Mas muito Dante, Petrarca, Shakespeare, Cervantes, Lorca, Rilke, Baudelaire, Eliot, Antonio Machado e tantos e tantos outros...
6- Como conciliar Teoria e Criação Poética?
Teoria e Criação Poética, principalmente se a Teoria Literária e a Literatura Comparada se vistos como convite à recepção e à produção poética, não se opõem, mas podem até ser de recíproco proveito.
A Leitura dos poetas, quanto mais ampla e quanto mais intensa, ajuda-nos bastante, porque nos propõe emulação e desafio( amistosos).
7- Quais as tendências da nova poesia Brasileira(hoje)?
Com alguma antecedência sobre alguns teóricos e críticos, as práticas da produção e da Teoria Literária e da Literatura Comparada, fizeram-me supor ( e praticar) uma poesia voltada para a Civilização Solidária, com ênfase para o encontro, a convivência e a prática da Liberdade.
No fundo, no fundo, sempre me pareceu que a Poesia é, por sua própria essência, difusiva, sempre uma proposta de encontro e solidariedade.
Parece-me que os poetas atuais buscam, sempre mais, registros e níveis de linguagem, que saibam conciliar rigor construtivo e liberdade expressivo-comunicativa.

Friday, December 16, 2005

Entrevista com Antônio Lázaro de Almeida Prado- 6ª parte

Que delícia, Antônio!
“Uma palavra de ordem do Barroco era o dito latino Carpe diem, que significa “Aproveita o dia de hoje!”. Outro dito latino bastante em voga foi Memento mori, que significa “Lembra-te, homem, que morrerás um dia!”. Na pintura, um mesmo quadro podia mostrar a opulência da vida levada à larga, enquanto num dos cantos inferiores aparecia retratada uma caveira. Em muitos aspectos, o Barroco foi marcado pela vaidade e pela irracionalidade. Mas também havia muitos que se preocupavam com o reverso da medalha, isto é, com a transitoriedade de todas as coisas, com o fato de que tudo o que hoje é belo ao nosso redor vai morrer e apodrecer um dia.”( O mundo de Sofia, de Jostein GaarderCia. das Letras, São Paulo, 1998. Tradução de João Azenha Jr.)Pode falar a respeito? Há algum trânsito entre sua obra Ciclo das chamas e o Barroco?
Você poderia falar um pouco sobre sua formação?

Tive a grande sorte de nascer e iniciar minha formação na cidade de Piracicaba e no (então) muito sólido Ensino Oficial no Instituto Sud Mennucci. Piracicaba sempre foi uma cidade não apenas aberta mas efetivamente cultora das Artes. Convivi com várias correntes de Pinturas, pertenci ao Orfeu Mirim Piracicabano, frequentei o Centro de Cultura Artística, que sempre levou a Piracicaba artístas e interpretes nacionais e internacionais apresentando-os em seu teatro Municipal. Sempre tivemos em Piracicaba não apenas a chamada Cultura erudita, mas e ao mesmo tempo um Centro Folclórico Piracicabano. Convivi com poetas, narradores, músicos, cientistas e pintores. Fiz 4 anos de seminário em Campinas com rigorosas e sólidas formações clássica, histórica e filológica. Findo o ginásio, cursei o curso clássico e ainda estudante passei a pertencer a Associação Paulista de Imprensa e a União Brasileira de Escritores. Licenciei-me em Linguas Neolatinas na USP e também na USP fiz doutoramento e livre docência. Lecionei na PUCSP e na USP, e depois transferi-me para Assis, onde fundei a Cadeira de Língua e Literatura Italiana, e onde , depois, assumi o cargo de titular da cadeira de teoria literária e literatura comparada. Tendo-me aposentado, sou hoje professor emérito da Unesp, que ajudei a implantar-se em Assis.
Interessante!
Por que a literatura brasileira é tão pouco traduzida, se todos os que tomam contato com ela aprovam sua alta qualidade?
carpe diem...
Envolver o Mundo
Em abraço estreito
Como se meu peito
Com vigor fecundo
Fosse todo feito
Só para esse efeito
De um amor profundo.
Abraçar a Vida
Com total ternura
Como se de pura
Luz impressentida
Fosse a tessitura
(sem taxa ou usura)
por todos fruída.
Construir a Terra
Sementeira farta
Que o pão reparta
Onde não se encerra
Onde não se enterra
Fruto, ciência ou carta,
Como quem se aparta.
Entoar um Canto Alegre, jocundo:
Bem, de todo mundo
Bem, que não se oculta
Bem, que não insulta
Bem, que não se enterra
Mas que abraça a Terra.
Uma curiosidade...
Por que o poema curto é o paradigma da poesia brasileira atual?
Tudo é cultura?
Sim! Tudo quanto represente uma alteração intencional da Natureza define a Cultura, que, por depender da intencionalidade, só pode ser produto da ação humana, seja nas Ciências, seja na Tecnologia, seja principalmente nas Artes. Por isso, como proclamava Baudelaire, A Natureza aguarda a interação humana, para adquirir sentido. Como observam os Antropólogos, Cultura nenhuma pode prescendir da Palavra Humana, que, aliás, é o veículo, atraavés do qual os Universais Humanos se instituem e se propagam.
Tem alguma epígrafe, um mote que o acompanhe pela vida?
poema curto...
A caracteristica do exito expressivo da poesia é a mínima mobilização de meios expressivos e a máxima potencialização simbólica.

Entrevista com Antônio Lázaro de Almeida Prado- 5ª parte



Mortalhas acadêmicas
"Golpes duros na vida me fizeram descobrir a literatura e a poesia. Ciência dá saberes à cabeça e poderes para o corpo. Literatura e poesia dão pão para corpo e alegria para a alma. Ciência é fogo e panela: coisas indispensáveis na cozinha. Mas poesia é o frango com quiabo, deleite para quem gosta... Quando jovem, Albert Camus disse que sonhava com um dia em que escreveria simplesmente o que lhe desse na cabeça. Estou tentando me aperfeiçoar nessa arte, embora ainda me sinta amarrado por antigas mortalhas acadêmicas. Sinto-me como Nietzsche, que dizia haver abandonado todas as ilusões de verdade. Ele nada mais era que um palhaço e um poeta. O primeiro nos salva pelo riso. O segundo pela beleza."(Rubem Alves)O que pensa a respeito dessa expressão:"amarrado por antigas mortalhas acadêmicas"?
Sabe, Antônio, tenho muito medo de afastar-me daquilo que é essencial na minha caminhada. então vivo me perguntando: o que é realmente importante? Tenho convicção de que regras são necessárias, mas tenho ímpetos de contrariá-las, às vezes. Esse poema de Drummond refere-se ao registro de uma experiência deceptiva do Mundo. Denuncia, por exemplo, em “Sociedade” a hipocrisia, a teatralidade obscena da vida regulada por convenções sociais que determinam o primado das aparências. Como você vê essas relações sociais?SociedadeO homem disse para o amigo:— Breve irei a tua casae levarei minha mulher.O amigo enfeitou a casae quando o homem chegou com a mulher,soltou uma dúzia de foguetes.O homem comeu e bebeu.A mulher bebeu e cantou.Os dois dançaram.O amigo estava muito satisfeito.Quando foi hora de sair,o amigo disse para o homem:Breve irei a tua casa.E apertou a mão dos dois.No caminho o homem resmungava:— Ora essa, era o que faltava.— E a mulher ajunta: — Que idiota.— A casa é um ninho de pulgas.— Reparaste o bife queimado?O piano ruim e a comida pouca.E todas as quintas-feiraseles voltam à casa do amigoque ainda não pôde
retribuir a visita.
Pausa
Antônio
O homem percorreu entre o grafismo sobre a pedra e a utilização do papiro e do pergaminho um longo caminho até chegar ao papel. No entanto, parece que outras formas incorporaram-se à vida do homem moderno. Quais os efeitos produzidos pelas novas técnicas de comunicação visual em relação à literatura produzida através do livro tradicional?
Antônio, mais uma vez juntos,obrigada pela oportunidade de usufruir sua presença.Ética jornalísticaNa história contemporânea brasileira a imprensa venceu grandes percalços, como a censura, que mascarava a realidade, contribuindo sobremaneira para o avanço democrático no Brasil. Conquanto nesses últimos anos de imprensa livre, um outro problema surgiu nos meios de comunicação, a questão ética. No decorrer da história política brasileira vários políticos souberam criar fatos, que visaram consolidar suas imagens públicas. A cobertura jornalística sobre política no Brasil sempre foi conceituada como exagerada, pois com a efervescência que ergue-se sobre os meios de comunicação, cada declaração ou gesto de políticos notórios é reproduzida pelos jornais, televisões, emissoras de rádio e internet, sem contudo, representar algo de novo. Como o jornalista Antônio vê esse quadro?
Jornalista há 60 anos sempre me pareceu que o acesso \os bens terciários ( Verdade, Beleza, Convivência) é um desafio proposto aos jornalistas. Dizia Agostinho de Hipona: ¨Todos os homens se comprazem na Verdade. E é fácil prová-lo: embora tenha visto alguns gostarem de enganar, nunca vi ninguém que quisesse ser enganado¨. Oferecer aos auditores e/ou leitores a possibilidade de contactar com a efetiva realidade dos fatos equivale a dar-lhes acesso a um bem terciário ( ou de expansão do ser). Cobrar sempre que os bens primários (ou de sustentação do ser) e os terciários (ou de expansão do ser) beneficiem a todos, sendo que os bens secundários (ou de luxo ou de requinte tecnológico) possam sofrer restrições em situações críticas, parece-me conatural ao exercício da Imprensa. Creio também que um bom jornalista deve denunciar a poluição informacional, vale dizer, o uso pernicioso do marketing, o estímulo ao consumismo e a filosofia do ¨tirar vantagem de tudo¨... Para mim o jornalista deve ser sempre um estimulante potencializador dos bens culturais e um incansável defensor dos direitos humanos.
Manifesto dos intelectuaisCerca de 150 intelectuais do país lançaram recentemente um manifesto criticando a forma como a atual crise política está sendo conduzida. O movimento foi organizado por professores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O documento, intitulado "Pela Investigação Rigorosa da Corrupção, pela Punição dos Envolvidos e pela Democracia", pede que as investigações "prossigam até o fim", inclusive "aquelas que apontem em direção à presidência da República", o que poderia levar a um processo de impeachment. O texto dos professores diz ainda que os interesses econômicos de PFL e PSDB fazem com que esses partidos "sacrifiquem" as investigações quando elas atingem o Ministério da Fazenda, "de modo a preservar a política econômica do governo com a qual concordam".O professor de ciências Políticas da Unicamp, Armando Boito, um dos coordenadores do manifesto, afirma que o governo Lula e o PT aderiu às antigas "práticas políticas antidemocráticas".Qual é o seu ponto de vista sobre esse manifesto? Ele procede?
Enquanto cidadãos conscientes, os jornalistas e os intelectuais devem sempre cobrar dos agentes políticos o rigoroso respeito aos bens públicos e a punição exemplar de quem quer que ouse fraudar e se apropriar de bens que devem servir excusivamente à população.
A vida
O poeta dramático espanhol Calderón de la Barca, que nasceu por volta de 1600, escreveu uma peça de teatro intitulada A vida é sonho. Nela ele diz: “O que é a vida? Fúria! O que é a vida? Espuma oca! Um poema, uma sombra quase! E a sorte não pode dar senão pouco: pois a vida é sonho e os sonhos, sonho…”.O que é a vida para o poeta Antônio?
Antônio, por favor, poderia responder as perguntas anteriores?
Quem é o leitor virtual de seu livro?
Como um dos poetas iniciais da Literatura Italiana ¨scrivo per diventar migliore:escrevo para tornar-me melhor¨, Acrescento : escrevo para conviver melhor. Meus poemas, meus livros, meus ensaios sempre se voltam para leitores e/ou auditores que saibam que a Poesia ( como as demais Artes) só pode produzir-se ou receber-se através do exercício das melhores virtualidades humanas.
A vida...
A vida, para mim, é um bem inestimável, cuja manutenção deve ser obrigação de todos os homens e mulheres. Nascemos e fomos criados para ter sempre mais vida. Mas, como espíritos em condição carnal, não podemos pretender-nos absolutos. Creio que, cumprido nosso estágio cronológico (que vai do nascer ao morrer) a vida apenas se transforma, sem ser destruída. E A PRESERVAÇÃO DELA TEM QUE SER CONQUISTADA E CONSTRUÍDA, DESDE AGORA PELO EXERCÍCIO DO AMOR. O amor como lembrou Dante Alighiere, permite-nos ¨transumanar¨, isto é ir além das naturais limitações humanas em direção ao ¨Amor que move o sol e as demais estrelas¨. Com Lêdo Ivo acredito que ¨o tempo é uma mentira das estrelas¨. e que chamados à vida a ela somos destinados para além do acidente ( superável) da morte...

Sunday, December 11, 2005

Entrevista com Antônio Lázaro de Almeida Prado- 4ª parte



Poesia é processo de auto-conhecimento? As linguagens induzindo o sujeito no caminho do sem-caminho? Você se interessa pelo diálogo entre filosofia e poesia?
Qual a ferramenta....

A SUMA E A SOMA

Com impalpáveis sons, fracos e flébeis,
Grito este amor demais, intenso e louco.
Para o qual as palavras são bem pouco
E os mais ousados versos soam débeis.
Quem os ler, saberá, talvez, um dia
Guiado pelos sons, captar a alma,
Que neles transformou furor em calma
Por não vê-los carentes de alegria?
Projeto nestes versos, concentrada,
A suma de meus dias, de meu sonho,
E a têmpera da alma apaixonada.
Nem sei se isso é nada ou muito pouco,
Só sei que quando posso neles ponho,
Talvez com voz fremente ou com som rouco.

Aplausos!

Há quem exagere a posição do poeta, tomando-o como um ente divino, dando-lhe poderes de construtor de um mundo onde o Eu torna-se uma realidade absoluta. Qual o lugar do lirismo ou do sentimento romântico na obra desses poetas? Que fazer dessa matéria poética que, de qualquer forma, sempre estará presente na alma dos homens?

Fernanda digitando e respondendo...

No posfácio de Ciclo das Chamas o prof. Dr Luiz Antônio de Figueiredo fala: ¨Uma Poética como a do Professor Almeida Prado, ao revéz de uma poesia pura, de literato para literatos, inscreve em cada poema a marca irrevogável da condição humana... Não existe forma que não possa manifestar o êxtase e a fragilidade da existência- métrica livre ou regular, redondilha, soneto ou quadra...¨. E eu Fernanda respondo, papai é também um filósofo, um pensador profundo que com suas palavras sempre nos encanta e nos toca profundamente.

Concordo, Fernanda! Essa conversa é enriquecedora. Reconheço o conhecimento, a sensibilidade de Antônio. Gostaria ter mais erudição para elaborar perguntas mais sábias. inclusive, deixo Antônio à vontade para conduzir nossa conversa, mudar "o rumo da prosa". Mestre que é, que sabedoria passaria aos poetas muito jovens, aos que ainda não aprenderam sozinhos ou “de repente”, como um dia disse o Rosa?

Sentimento romântico...

Nos diz novamente o prof.Luiz Antônio de Figueiredo: ¨E fazendo-se exemplo do Amor encarnado, do instante que vislumbra a Eternidade, dedica parte significativa dos poemas à esposa Themis- Arquétipo da Mulher e Mãe de seus sete filhos, símbolo vivo do Amor, único sentimento capaz de eludir a morte!¨.

Cantiga para Themis

Meu coração chegou

Ao mundo da surpresa

E, ao te ver,

Princesa,

De pronto se inflamou.

Eu disse ao coração:

-Amigo, tem cuidado,

Te sinto enamorado,

Queimando de paixão.

O tempo não passou,

Parou naquele instante,

E nosso amor, constante,

Ao tempo nem ligou:

Assim, és a menina

De ontem, hoje e agora,

Pois hoje é nossa hora

E amar-te é sorte e sina.

Thursday, December 08, 2005

Entrevista com Antônio Lázaro de Almeida Prado- 3ª parte


Esta a instigante tarefa que temos pela frente: saber combater os vícios egocêntricos que moldam em nós o homem e a mulher velhos e, esvaziados de nós mesmos, plenos de amor, criar relações sociais e estruturas sociais solidárias e cuja emulação tenha a sua fonte em nossa própria subjetividade, lá onde habita Aquele que é mais íntimo a nós do que nós a nós mesmos, um Outro que não apreendemos e, no entanto, funda a nossa verdade identidade, a de seres vocacionados ao amor.
Fernando Pessoa olhou para sua própria vida e não se reconheceu no que foi; escondera-se por detrás de máscaras e, corajoso, desabafou:"Vivi, estudei, amei, e até cri,E hoje, não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu...Fiz de mim o que não soube,E o que podia fazer de mim não o fiz.O dominó que vesti era errado.Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-meQuando quis tirar a máscara,Estava pegada à cara."O que você pensa sobre essas máscaras, esses mecanismos utilizados pelo ser humano? Você foi fiel a si mesmo na sua trajetória?
Penso que meu poema Deixa a Narciso responde esta questão.
Deixa a Narciso...
Deixa a Narciso
O fascínio da imagem
Auto-desdobrada.
Deixa fluir o amor,
Inunda-te de amor,
Que tudo mais é nada.
Deixa a palavra voar
Sem ecos redundantes,
Sem peias nos ouvidos
Sem temor à blandice
Do canto das sereias.
Mais sagaz do que Odisseu
Deixa às sereias o canto inútil.
Deixa a Narciso
A autocomplacência
Do egotismo.
Amor repete amor,
Sem ecos infecundos,
Sacia-te de amor,
Essa insaciável fonte
Que não suporta diques,
Nem margens minudentes.
Deixa a Narciso
A oclusão da imagem:
Ama!
Que delícia ler esse poema! Parabéns! "A poesia brasileira não é uma indígena civilizada; é uma grega vestida à francesa e à portuguesa, e climatizada no Brasil; é um a virgem do Hélicon que, peregrinando pelo mundo, estragou seu manto, talhado pelas mãos de Homero, e sentada à sombra das palmeiras da América, se apraz ainda com as reminiscências da pátria, cuida ouvir o doce murmúrio da castalha, o trépido sussurro do London e do Ismeno, e toma por um rouxinol o sabiá que gorjeia entre os galhos da laranjeira."O que pensa sobre essa afirmação?
Outra coisa... Há muito de grego e romano na tradição poética do ocidente?
Você foi fiel a si mesmo em sua trajetória?
Para mim o grande problema de Fernando Pessoa foi não ter encontrado parceiros artísticos proporcionados à sua própria dimensão artística. Seus heterônimos implicaram sempre uma tentativa de buscar parceiros de diálogo. Há um traço doloroso e muito lúcido num quase desespêro de sentir-se só. Julgo que minha trajetória, embora bem modesta, é fiel a uma busca pertinaz de solidariedade humana e que, nessa busca procuro inspirar-me sempre no caráter articulador da poesia.
Qual a ferramenta fundamental de um escritor (poeta)?
Penso que a poesia não se esgota em limites temporais e espaçiais. Os poetas sempre se sentirão solidários com as lições do passado mas sempre empenhados em aceitar os desafios do presente. Assim quando Mário de Andrade dizia: ¨Brasileiros, chegou a hora de realizar o Brasil¨nada mais fez do que dizer que, embora buscando sempre o universal, sempre nos sentiremos radicados em nossa própria cultura. Cassiano Ricardo se definiu como ¨Sou local pelos pés/ Pássaro universal pelo pensamento

Entrevista com Antônio Lázaro de Almeida Prado- 2ª parte





Antônio, O grande pensador Edgar Morin disse que “o homem ainda não completou suahumanidade”, seu edifício, sua obra (ainda que utópica) redentora. Qual é sua opinião a esse respeito?
A propósito, lindo o poema.
O teólogo e filósofo Jolif no clássico livro Compreender o homem salienta que o ser humano tende sempre a aperfeiçoa-se, não havendo limite final para essa empresa. Como ele penso que, elos que somos da humanidade, temos sempre que assumir nosso tempo histórico tentando transcendê-lo. A isso Dante Alighieri, talvez o maior poeta que a história conheceu, chama de um amistoso desafio ¨transumanar¨, na expressão dele.
Interessante! Sobre o tempo...Kairós é a plenificação de todos os tempos. É o tempo esgotado, capaz de englobar todas as dimensões da vida e da história. É essa percepção de que tudo que existe subsiste, pré-existe e coexiste, é que nos faz tomar consciência de que somos naturalmente solidários ao Universo Somos o Universo que se olha com os nossos olhos. Daí a importância de que essa conaturalidade se estenda à solidariedade impelida por nossos gestos de compaixão e amor. Sua obra CICLO DAS CHAMAS convida à solidariedade?
Penso que o fruto do amor é a vida. É por vivermos num sistema unipolar, o capitalismo globalizado, que nega a vida de milhões de pessoas para assegurar o requinte de uns poucos, é que somos convocados a fazer de nossas vidas alimentos para que outros tenham vida.
hiperpoesia.... A meu ver sempre precisamos da poesia, que por sua essência generosamente busca o universal. Tinha razão Francesco Flora que reagindo ao particularismo fascista afirmou: ¨Dante não é grande apenas por ser italiano, mas porque, italiano, soube falar uma linguagem universal¨. Acredito, aliás na companhia de muitos outros poetas, que nosso atual desafio é ultrapassar as barreiras do ¨universo solitário¨e buscarmos o ¨universo solidário¨.
A solidariedade nasce da gratuidade e, portanto, da espiritualidade. Há traço religioso (espiritualista) nos seus poemas?
Neo-RealismoCorrente literária de influência italiana que anexa algumas componentes da literatura brasileira, nomeadamente a da denúncia das injustiças sociais do romance nordestino. Quer na poesia, quer na prosa assume uma dimensão de intervenção social. Essa característica está presente na sua obra?
Ciclo das Chamas e outros poemas...
Ciclo das Chamas, como notou Antônio Cândido nasceu e se cumpre numa busca de justiça, solidariedade e liberdade, porisso não se prende a particularismos maniqueístas. Se tivesse que definir-me tomaria de empréstimo a Pio Baroja uma definição para o que sou ¨um hombre humilde y errante¨.

Entrevista com Antônio Lázaro de Almeida Prado- 1ª parte




Tive a honra de entrevistar Antônio, Professor Emérito da UNESP, poeta e jornalista, na minha comunidade Discutindo Literatura, no orkut.
http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm=3332336&tid=2424700199003872931&na=3&nst=-2&nid=3332336-2424700199003872931-2424720890005074924







O colóquio:
Professor Antônio, bem-vindo! Obrigada por nos honrar com sua presença. Para começar nosso colóquio, a poesia é mesmo necessária?
A poesia foi sempre e será sempre companheira inseparável dos homens, porque é o canal mais adequado que permite condividir através de palavras os movimentos mais caracteristicamente humanos: emoções, solidariedade, ansias, anseios e temores. Daí o caráter essencialmente unitivo, vale dizer articulador, da arte literária.
Voltando à poesia, qual é a sua concepção do fazer poético? Para você,(posso?) a criação poética é um trabalho de transpiração, de inspiração, de respiração ou de transe? Ou é tudo isso ao mesmo tempo?
Penso que a melhor visão sobre o fazer poético foi definido por Giambattista Vico. Segundo ele todas as crianças, vale dizer, todos os seres têm naturalmente vocação poética. A isso acrescento que de todas as artes a mais fundamentalmente humana é a arte da palavra, que requer, para fazê-la ou recebê-la, o exercício empenhado das melhores virtualidades humanas. Com isso, a poesia participa e requer inspiração, construção: aquela e esta imprescindíveis. Não há poesia que se faça pelo facilitário e é ela sempre fruto de um lúcido ajuste de emoções e palavras.
Virgílio disse: "Sed fugit interea, fugit inreparabile tempus, singula dum capti circumvectamur amore" ("Geórgicas", 3, 284). Na bela mas pouco literal tradução de António Feliciano de Castilho isso dá: "Quisera abranger tudo, e tudo me convida; mas o tempo é fugaz, e curta e incerta a vida. Como é sua relação com o tempo, Antônio? O virar da ampulheta causa que sentimento em você?"Quero inventar a vida" Esse verso do seu poema INVENÇÃO DA ALEGRIA solicita um novo tempo?
"Itinerário de Pasárgada", onde Manuel Bandeira faz algumas revelações sobre seu métier de poeta seria fruto dessa necessidade de recriar a vida, de movimentar o tempo?
O tempo propõe sempre aos poetas promessas e surpresas, inscrito na temporalidade o homem, no mais íntimo de sí próprio, clama sempre pela permanência e pela continuidade da vida. Só os grandes poetas místicos, como São Franscico de Assis, Santa Tereza de Ávila ou Jacopone da Todi podem dizer, por exemplo, ¨louvado seja, Senhor, pela nossa irmã Morte¨, ¨Y muero porque no muero¨, ¨Signor, per cortesia, famme morir d'amore¨. Para mim o tempo é sempre uma agradável surpresa e um arcano desafio.
Se você tivesse que fazer seu “itinerário de Pasárgada”, que traços seriam os mais definidores de sua aventura poética?
Para Lêdo Ivo..
¨O tempo é uma mentira das estrelas¨. Mas para muitos poetas o tempo é sempre uma ameaça, que eles pretendem exorcizar.
Nos dias que vivemos – os da suposta pós-modernidade – estaríamos diante da necessidade da hiperpoesia para responder à expansão de um modo de pensamento compartimentado, atomizado,globalizado?
Itinerário de Passárgada
Respondo com meu poema: Biografia.

Biografia

Cobrei da vida
A taxa da alegria,
Plantei no solo
A safra dos instantes.
Amei, sofri, cantei,
Eis o que importa...
O resto é sobra
De mito e lenda...


Afinar ou desafinar: uma escolha


Como disse Guimarães Rosa o sertão é dentro da gente. Buscamos a completude, a satisfãção plena, a felicidade total. Andamos prisioneiros dos nossos ideais. Herdamos sonhos miúdos.
Há que se pensar na efemeridade das coisas, na necessidade de reformular conceitos e comportamentos. Afinal, somos seres em construção, afinando ou desafinando pela vida.
Alguém já disse que após um dia, há sempre um outro a redimi-lo.Como um rio sem foz. O tempo nos trespassa e nunca se esvazia. Seu leito somos nós.
A decisão de afinar ou desafinar é nossa. Precisamos abraçar guitarras, passos, chuvas ternas, visões líricas, colecionar tardes e alvoradas, borboletas tresvairadas, afinal, a vida tem outras portas, muitas portas.

Amor nenhum





Certos amores são abscessos que terminam por suporação. Amor aprazado, suprimido, Infectado, não resiste.Com o tempo, percebe-se que houve deserção, o amor
partiu aportado de mágoas.


Se estou desabituando-me do amor? Não. Na madureza ainda há coração tomado de assalto, esperanças fundadas em promessas...A certa altura da vida você já expeliu do peito algumas inocências, despachou mulambarias, desapossou, decifrou...Após algum amor faltoso, desencaminhado, segue-se tempo intervalado. Aprende-se a fazer farol, a sustentar o olhar, a colecionar instrumentos para sondar. Pode-se realizar inquéritos minuciosos.Mas o amor tem suas proezas: achando o coração depurado e limpo, investe, sabedor que não há a cessação da capacidade de amar. Continua o fagulhamento. O amor sabe que o coração humano possui asas membranosas e nuas, toques de fragilidades; borboletas que encontram uma forma de quebrar o escafandro.

Tempo de não desistir

O Éden, o jardim de Deus, lugar onde Deus “plantou” o homem, tem abundância, tem fontes. Fonte fala de águas que correm. Água: alimento, frescor, dinamismo, vibração, plenitude, purificação. A porta da fonte deve estar continuamente aberta em nosso alma. Nosso jardim particular, nosso jardim comum, necessita abarcar a dimensão da Fonte das Águas Vivas.
Que amor nos move em direção a nós mesmos, ao outro, a Deus? Perdoamos realmente? Desistimos facilmente da pessoas pelas suas falhas?
Há um registro que me chama atenção no livro Bíblico de Oséias, capítulo onze, versículo oito: “Como te deixaria, ó Efraim?” Essas palavras de amor são dirigidas em tempos de apostasia de Efraim. Deus atraía seu filho pelo perdão, pelo amor abundante, frutífero. Deus não desiste de nós. Mas nós desistimos de nós mesmos, desistimos de viver, desistimos das pessoas ao avistarmos suas falhas.
Um dia de grande importância para os judeus é o Yom Kippur, que é o dia do perdão. Somos seres relacionais, formamos alianças de afetividade, de intimidade, alimentamos expectativas várias. Essas relações nos trazem sorrisos, felicidades, como também sofrimentos emocionais, frustrações. Molduras quebradas, botões que não se rompem na profusão de pétalas sonhadas. Manhãs com cheiro de desilusão. A semente parecia boa, a terra parecia pronta. O sol, a água, tudo na dosagem pedida; todavia, a flor não veio, não veio o milagre esperado. Algo aconteceu fora do nosso controle. O outro é uma surpresa. A surpresa sou eu. Provocamos e/ou sofremos feridas.
Nosso jardim não é perfeito. Nossa humanidade é impactante. E mesmo desejosos por mudança, sofremos constrangimentos. Se buscamos a reconciliação, a generosidade, a tolerância, o perdão, nem sempre somos bem recebidos. Para cada estágio de restauração, por vezes virá um nível de ataque: escárnio, conspiração, ameaças, astúcias, acusações, intimidações, sutilezas...
Quantos erros cometidos! E quantas conseqüências! Esse processo: erro, reconhecimento do erro, arrependimento, confissão, mudança, pode ser doloroso, mas tem algo de libertador que vale a pena experimentar. Assim como é necessário enxergar as razões do outro, analisar as circunstâncias que o envolveram, para liberar o perdão. Conhecer as fragilidades, abrir-se em pétalas de humildade, saber-se em processo, em fazer-se constante, em semeadura, oferecer redenção, possibilidade de cura, de reencontros, tudo isso, esse olhar de lucidez para si e para o outro, abre portas de cárceres, constrói pontes, chegadas, nascimentos.
Há que ser valente, hábil, cheio de fé para resistir, para não desistir, para lidar com imperfeições, as nossas, as dos outros. O dia que está por vir traz um novo desafio, um novo chamado, vale viver para gozá-lo.

Entre viver e existir

Tivesse coragem mudava o rumo, seria a mulher virtuosa de provérbios, cumpriria meus votos, não iria vistoriar a volta do pé de ninguém, nem iria rodar a baiana quando pisassem no meu calo, usaria mais eufemismos e a quem me pedisse a capa eu daria, mas eu não dou minha cara a tapa e sempre tenho algo a falar em qualquer reunião, é chato sempre ter algo a falar, mais chato ainda é nunca ter nada a ser dito, detesto reuniões recheadas de mensagens, aquele chove não molha, musiquinhas, tudo o que é tentativa de integrar, é mecânico demais, gosto de reuniões honestas, objetivas, rápidas.
Também gosto de boas intenções, tenho tantas boas intenções, se fosse planta e vingasse daria um jardim imenso, infelizmente muitos planos se perdem, meu curso de fotografia sempre adiado, um rosário de decisões para viver amanhã, tempo perdido com inutilidades. Melhor assistir a algum chilique, pessoas fora do seu estado normal são divertidas, eu fico assim se me obrigam a engolir sapos, se convivo por muito tempo com gente cheia de pose, ou com gente com cara de enterro, pior ainda se for com gente paroleira que desaba-se em perguntas cretinas sobre o seu peso, a sua careca, o casamento que ainda não aconteceu, a gravidez um pouco demorada, o seu divórcio, a morte de algum familiar, a dependência química do seu primo, qualquer outra perguntinha cercada de veneno.
Incrível como pessoas podem se especializar em inconveniências, a lista seria numerosa, não vale a pena desfiá-la, melhor puxar outros fios, novelos cheios de cores, como minha paixão por cachoeiras, margaridas e lírios do campo, histórias lidas de trás para frente, poemas, tardes contemplativas em algum café, chá de capim limão, rede, boas risadas com os amigos, um fio de conversa que dura uma noite inteira e não se acaba, uma taça de vinho, um sarau, um recadinho na secretária eletrônica, alguns luxos em forma de abraços, massagens, toques nos cabelos, um aproveitamento verdadeiro dessa vida, que se traduz em confiança, se alguém confia em mim, pronto, sou um cão fiel, falta de respeito eu não admito, chutar cachorro morto não faço, gosto de brigar com quem esteja de pé, mas tem quem bata e depois se agache, isso me dá uma raiva, ainda bem que passa logo que não vou virar um saco de amargura, não eu que aprecio cores fortes, que dos embates da vida e da velhice não tenho medo, só quero mais que viver, quero existir, existir a contento.

Wednesday, December 07, 2005

"No princípio era o Verbo"

A palavra- parole- estava presente na Criação do mundo. Faz parte da nossa vida. Através dela iniciamos ou damos fim às nossas relações. Ela permite o convívio. Por isso foi escolhida para ser título do meu Blog.
Sou professora, membro da Academia Itaperunense de Letras, ocupo a cadeira de nº7, patronímica de Gonçalves Dias. Publiquei dois livros: Renascer- poemas e Sobre tempos e jardins- crônicas. Fui colunista do Jornal tribuna do Noroeste durante 5 anos, assinando a coluna O Vôo da Garça, espaço destinado à Academia Itaperunense de Letras.

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Considerações sobre o amor
“Amar é a verdadeira sacanagem.”
( Tom Jobim)



Tenho algumas perguntas sobre o verbo intransitivo AMAR. Cabe a você escolher a forma de amar, de ser amada, ou isso ocorre alheio à sua vontade? Amor idealizado, amor sufocado, amor romântico, amor fraterno, amor possessivo, amor ardente, amor renitente, amor fatigado, amor como remédio para algum “buraco” existencial, amor “alma gêmea”, amor fugaz, amor sagaz, amor cego, “amor em pó, amor em barra, amor com farra, amor transbordado” (Paulinho Moska).
Amor eletromagnético, amor de dopamina e norepinefrina, amor simétrico, amor à primeira vista, amor de borboletas no estômago, amor de receita, amor clichê, amor com agravantes, amor mito de Psique e Eros.
Amor de consumo, amor às pressas, amor que não se mede, amor em estado de graça, amor semeado, amor capaz de extremos, amor capturado, amor domesticado, amor jurado, amor sacramentado, amor proibido, amor despudorado, amor de contrato, amor celebrado, amor vivido,amor esquecido.
Amor de rega, amor de poda, amor de flores de estufa. Que caprichos o amor não requer... Um trabalho gostoso, mas com método, disciplina, investimento. Como é difícil o desejo de amar!
Onde se apura o amor? Entre taças e cálices, entre gestos, entre dizer e não-dizer é que se apura o amor? Mas o amor também se apura nos intervalos amorosos... Afinal, o amor não vive apenas numa atmosfera da lareira com vinho.
Há que se fazer ajustes entre o desejo e o fado. E a tudo o amor reclama, para não ser desamor não suprido.
O amor pede orvalho, suspira transparência, quer o rufar dos tambores, um festival de asas ensaiando vôo. O amor quer celebração, alumbramento, dança, música, e dedilha no ardor das cordas seu delito de “amar, desamar, amar”.
Então o amor não é um só? O nosso amor a gente tece, a gente veste, “o nosso amor a gente inventa” (Cazuza)?
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